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Eu vi deus e ele é uma mulher negra

A frase é do amigo João Pinheiro e eu a pego emprestada para resumir minhas impressões sobre o show do elogiado disco “A mulher do fim do mundo”, de Elza Soares, realizado no Teatro Riachuelo na última sexta-feira (22).

Que show! Teatral, ritualístico, potente! Ao abrir as cortinas, Elza está lá, sentada em um trono alto no centro do palco, seu vestido desce até o chão. Elza tem um cabelo rosa black power. Com a iluminação focada a cantora ganha ares de divindade. Ao seu redor, nove incríveis músicos dão arranjos modernos e ousados para acompanhar sua voz poderosa.

Deus é Elza, a mulher do fim do mundo. Um fim do mundo que é todo dia nos muitos confins desse país. Elza sabe disso e canta isso porque não esquece de onde veio, não esquece o que viveu.

78 anos! O peso da idade é sentido em alguns momentos do show. Elza às vezes parece cansada, sua voz parece falhar, mas Elza resiste. Elza é marra. Mulher de marra. Se um pouco cansada, com problemas na coluna que só lhe permitem se apresentar sentada, Elza ainda dança, levemente no trono, em seu altar, ela samba a mão sobre a coxa.

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Seu corpo é forte, seu sangue, sua voz, sua música. Elza sabe atingir o público em cheio com temas atuais, pesados, sem esquecer da poesia.

Canta canções de denúncia e sentimento que nos mostram feridas abertas que sabemos que vamos encontrar ao sair do teatro, fora do shopping. Elza canta contra o machismo, contra o racismo, contra a homofobia, contra todo tipo de preconceito.

Quem esteve no teatro pôde ver momentos emocionantes, como na música manifesto Maria da Vila Matilde: “Você vai se arrepender de levantar a mão pra mim”, acompanhada em caixa alta pelo público.

Em A Carne, Elza repete seguidas vezes “Eu sou Negra, Negra, eu sou Negra”. É aplaudida de pé.

Na música Benedita, sobre uma travesti, o ator Rubi entra em cena numa participação performática, e se mantém no palco até a versão carinhosa de Malandro, de Jorge Aragão. Belíssimo!

Elza ainda volta no bis para encerrar a apresentação/ritual com Volta por Cima, de Paulo Vanzolini, e se despedir do público potiguar, que a ovacionou de pé. Justo!

Fotos: Diego Marcel

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