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Crítica: Judas e o Messias Negro e o seu lembrete indelével que a luta negra continua

O símbolo do punho erguido para cima marcou a história americana de maneira indelével e é quase impossível que alguém do último século não o conheça, ele foi símbolo do partido político formado para a defesa da comunidade afro-americana, os Panteras Negras – partido que surgiu como um grupo voltado ao combate contra a violência policial destinada aos negros durante a década de 1960.

A ideologia revolucionária que – através da autodefesa armada – buscava proteger a comunidade negra das ameaças policiais fez com que o grupo crescesse e, assim, chamasse atenção das autoridades. Causando, consequentemente, forte repressão do governo dos Estados Unidos, sendo perseguidos pelo FBI que, incansavelmente, realizou ações para enfraquecer e dissolver o grupo, o qual acabou desaparecendo na década de 1980.

Parte da história desse movimento e dos seus integrantes é retratada no filme “Judas e o Messias Negro”, dirigido pelo Shaka King e produzido ao lado de Ryan Coogler e Charles King. Nesse recorte histórico escolhido por Shaka King que moram os grandes acertos e erros na concepção do roteiro do filme, o qual também foi responsável.

A grande assertividade é que o filme não fala exclusivamente do líder do movimento Fred Hampton, interpretado pelo brilhante Daniel Kaluuya, embora ele seja o personagem chave de toda a trama. O filme – e recorte histórico – é feito pelos olhos de William O’Neal, o homem que traiu o movimento e seu líder. O’Neal é apresentado aqui como o informante pago pelo FBI para se infiltrar na organização Panteras Negras e ajudar o FBI a planejar o ataque responsável pela morte de Fred Hampton.

Nesse período o FBI era chefiado por J. Edgar Hoover, que temendo o surgimento de um “messias negro”, utilizou as informações que O’Neal teria fornecido como a planta do apartamento de Hampton, que foi invadido bem como horários, como viabilizadores do fim trágico e prematuro do líder do movimento.

É essa narrativa interessantíssima e – talvez – pouco conhecida que Shaka King nos oferece no filme “Judas e Messias Negro”, mas o grande e único problema aqui é ela ser uma narrativa única. Para um público pouco familiarizado com história americana o período histórico, surgimento do movimento, histórico de vida do seu líder, são informações valiosas para que se possa entender e dimensionar a importância do movimento Panteras Negras até os dias de hoje. E Shaka King, infelizmente, negligenciou um público não americano que possivelmente não acessou essas informações previamente.

Retirado esse problema de construção narrativa, o longa segue entregando uma fotografia espetacular, com captações de imagem pouco convencionais e inusitadas, quando deliberadamente escolhe não enquadrar seus personagens de maneira total, fazendo com que as imagens sejam cortadas pela tela. Uma linguagem única que torna algumas passagens do filme memoráveis, que são brindadas pelo belíssimo trabalho de montagem.

Um dos grandes destaques de “Judas e o Messias Negro” são as atuações primorosas de Daniel Kaluuya que interpreta o Fred Hampton e o Lakeith Stanfield que interpreta o William O’Neal, esse último trabalhou de maneira excepcional, entregando um trabalho verossímil e genuíno que nos mantém ansiosos pelas suas aparições na tela.

Judas e o Messias negro é um filme concebido para as premiações, já que não falha em nenhuma das categorias na sua execução. Mas, também é um filme concebido para nos lembrar que a luta negra continua, que o combate ao racismo segue e que – infelizmente – a violência destinada a população negra mudou muito pouco daquele período para os tempos atuais.

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